Benjamin Ribeiro da Silva (*)
O ano de 2020 vai entrar para a história, e não deverá ser esquecido por décadas, em função da pandemia e suas consequências. Ele também deverá ser lembrado pelos tristes fatos com os quais somos obrigados a conviver, à mercê de políticos que insistem em negar a ciência – em nome dela! – em função da eleição a qualquer preço, mesmo que seja o preço de interferir gravemente com a vida e a saúde física, psíquica, emocional, social e pedagógica das crianças e adolescentes, impedindo a volta às aulas, mesmo que parcialmente, para atividades de acolhimento e reforço.
E, se os pequenos estão em casa, confinados, como se contaminam e até mesmo morrem, infelizmente? Isso acontece porque estão convivendo com jovens e adultos que saem para trabalhar, usam transporte público lotado, se contaminam e transmitem a doença.
Quem diz isso é a ciência: estudo realizado pelo Instituto Pasteur, na França, a partir de seis escolas em uma região (Crépy-en-Valois) altamente afetada pela Covid-19, entre as 1.340 pessoas analisadas nas escolas de ensino básico, 139 foram infectadas em algum momento antes pelo coronavírus – 81 adultos e 58 crianças. Ou seja, apenas 8,8% das crianças. Um total de 61% dos pais de crianças infectadas contraiu o vírus, em comparação com 6,9% de pais não contaminados. Os pesquisadores concluíram que eram os pais quem geralmente infectavam os filhos, e não o contrário.
A própria OMS já afirmou que as escolas não são o motor principal de transmissão da Covid-19. O ECDC, centro de prevenção de doenças europeu, afirmou, com propriedade, que as escolas são uma parte essencial da vida das crianças. E que, nos países que já reabriram as escolas, “não se registraram aumento nos contágios”.
De fato. Novos estudos divulgados continuam demostrando que é possível a volta às aulas, com segurança. O “Covid-19 e a reabertura das escolas”, elaborado por médicos e especialistas, mostra e fundamenta experiência bem-sucedida em mais de 15 países. Na Dinamarca, as escolas retornaram 30 dias após o início da pandemia, bem próximo do pico da curva de contágio, antes mesmo de várias atividades econômicas. Na Bélgica, que teve mais mortes do que o Brasil, quando se comparam os óbitos com o total da população, o retorno foi em 68 dias.
Em ambos os países, a volta às aulas “não alterou a curva da doença e não houve um surto causado pela reabertura: isto é muito importante. Não é opinião, são fatos”, observa o médico Fabio Jung, um dos coordenadores do estudo, que cita ainda Vietnã, Camboja e Nigéria, países até com menos condição socioeconômica que nós, que já iniciaram o processo de reaberta das escolas. “A quarentena não elimina a doença, só achata a curva de contágio”, frisa Jung.
Por aqui, a tragédia anunciada é a de que a cidade de São Paulo baterá um recorde mundial de 198 dias de escolas fechadas, em 5 de outubro. Ruim? Ainda poderá ficar pior: o prefeito condiciona o retorno aos resultados de testes sorológicos. Mas o que esse teste revela? Por acaso seria uma informação crucial, de que criança está com a doença e precisa ser encaminhada para tratamento? Não! O teste só identifica se há ou não a presença de anticorpos. Mais nada. Se foi contaminada no passado. Fica claro que é apenas uma cortina de fumaça, para tentar justificar o injustificável.
Os paulistanos, forçados a conviver com o uso eleitoreiro da doença, não devem ter dúvidas a respeito de quem é o responsável por essa trágica situação. A OCDE indica um impacto mundial profundo que vai durar até o final do século, em função do fechamento das escolas por 14 semanas, ou 98 dias (à época no Brasil eram 16 semanas). O que se dirá então de 198 dias? Ou ainda além, até 2021, como já anunciaram vários prefeitos? O ano de 2020 vai mesmo se estender pela história.
(*) Presidente do Sindicato dos Estabelecimentos de Ensino do Estado de São Paulo – Sieeesp