
Advogado Pedro Quagliato/Foto: Rocon&Graça Com
Pedro Quagliato
A COP30, programada para 2025 em Belém, deveria representar um marco positivo para o Brasil: um momento histórico para apresentar ao mundo nosso compromisso com a sustentabilidade, com a Amazônia e com a construção de uma economia verde, inclusiva e responsável. No entanto, o que deveria ser uma vitrine de boas práticas está rapidamente se tornando um retrato da exploração e do oportunismo. A razão? A conduta abusiva de diversos hotéis e pousadas que decidiram multiplicar seus preços de forma desproporcional, transformando a demanda internacional em uma oportunidade de lucro fácil e ilegal.
Relatos apontam que hotéis de padrão três estrelas estão cobrando diárias superiores às de suítes no Copacabana Palace, um dos mais luxuosos do país. Isso não é um “ajuste de mercado”. Não se trata de flutuação sazonal ou simples lei da oferta e da procura. Trata-se de abuso, e o ordenamento jurídico brasileiro é taxativo ao condenar essa prática.
O Código de Defesa do Consumidor (CDC), em seu artigo 39, inciso V, proíbe expressamente que o fornecedor exija do consumidor “vantagem manifestamente excessiva”. Já o artigo 51, inciso IV, considera nulas de pleno direito as cláusulas que imponham obrigações abusivas ou que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada. A elevação artificial de preços motivada por um evento internacional de grande repercussão e sem qualquer melhoria proporcional dos serviços prestados é exemplo clássico de infração a esses dispositivos legais.
O escândalo é tamanho que já começa a provocar repercussões diplomáticas. O presidente da Áustria, Alexander Van der Bellen, anunciou o cancelamento de sua participação na COP30, justamente por considerar os custos da viagem a Belém “excessivamente altos e injustificáveis”. Trata-se de um alerta grave: o Brasil corre o risco de transformar um evento global em um fiasco por conta da ganância local.
Diante desse cenário, não se pode ignorar a responsabilidade jurídica dos entes públicos: Município, Estado e União. Todos possuem deveres constitucionais e legais de fiscalizar práticas abusivas, proteger o consumidor e garantir a imagem institucional do país. A omissão no enfrentamento desses abusos pode ensejar responsabilização administrativa e judicial, além de configurar falha grave na gestão de um evento de interesse global. A ausência de medidas concretas dos órgãos públicos, incluindo os Procons, Ministério Público e secretarias de turismo, contribui diretamente para a perpetuação do problema.
Mais do que um desrespeito à norma jurídica, o comportamento de parte da rede hoteleira de Belém é um tiro no pé do país. Em vez de acolher visitantes, pesquisadores, diplomatas e ambientalistas com hospitalidade e profissionalismo, o que muitos verão será uma tentativa descarada de lucrar com o evento às custas de quem deseja contribuir com um futuro melhor para o planeta.
É fundamental que os órgãos de defesa do consumidor, Procons, Ministério Público e entidades civis, atuem com rigor. Investigações devem ser abertas, práticas abusivas coibidas e eventuais sanções aplicadas. É inaceitável que um evento com o potencial transformador da COP30 seja manchado por práticas comerciais predatórias, que envergonham o país diante da comunidade internacional.
A imagem que projetamos ao mundo começa pela forma como tratamos quem bate à nossa porta.

* Pedro Quagliato atua no Quagliato Advogados e é especialista em Direito do Consumidor e mestrando em Direito Empresarial