O que a sonoridade das cordas do violino, violão cigano e contrabaixo acústico tem a ver com o funk Baile na Favela? E o que o movimento Zazou da França da Segunda Guerra Mundial tem a ver com o Brasil em 2022? Para o violinista, compositor, arranjador, pesquisador e produtor musical Ernani Teixeira, são muitas as conexões e elas inspiraram a produção do show de música instrumental Sons de Liberdade, que estreia no dia 28 de agosto às 17h no Centro Cultural Casarão, com entrada gratuita.
Ouça aqui uma palinha de uma das músicas do repertório.
O quarteto liderado por Ernani Teixeira conta com os violões ciganos de Marcelo Modesto (parceiro de Ernani há mais de 20 anos no Hot Jazz Club) e Bina Coquet e o contrabaixo acústico de Nando Vicencio.
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Passado e presente
O repertório no estilo jazz manouche leva o público a uma viagem sonora através do tempo, guiada pelo elo entre a música e a resistência política em diferentes momentos históricos no Brasil e no mundo. As composições escolhidas, além da resistência e crítica em seus contextos históricos, defendem a liberdade e combatem o fascismo, o preconceito, a perseguição às manifestações culturais, a xenofobia, o racismo, infelizmente ainda existentes na atualidade.
O show começa pela música Zaz Zuh Zaz de Cab Calloway (1933), que acabou inspirando o nome do movimento de contracultura Zazou, originado na França em oposição à ocupação nazista na Segunda Guerra Mundial. O movimento foi um dos ícones da Resistência Francesa por meio da música. O nome Zazou foi dado a partir de uma chanson de Johnny Hess referindo-se aos jovens franceses que ouviam o swing americano Zaz Zuh Za.
Confira aqui o que os jovens Zazous gostavam de ouvir
Na época, a juventude contestadora cultivava o gosto pelo swing das bandas de baile de jazz negro americano e pelo jazz manouche (também conhecido como gypsy jazz ou jazz cigano) que agregou ao jazz a sonoridade de violões e violinos dos ciganos, instrumentos portáteis adequados ao estilo de vida nômade. Tanto o swing das bandas de baile jazz negro americano como o jazz manouch, por suas origens nas culturas negra e cigana, eram considerados pelos nazi-fascistas como “degenerados”. “Quando havia paradas da Juventude Patriótica Francesa (juventude fascista), os Zazous marcavam uma sessão de discotecagem de swing pelas redondezas. Quando os judeus foram marcados com estrelas amarelas identificando-os como tais, os Zazous bordaram e portavam por iniciativa própria estrelas amarelas com as inscrições “Zazou”, “Swing”, e até mesmo “Goï” (não-judeu – ou seja, querendo dizer “não importa se você é judeu ou não-judeu, somos todos iguais, se discrimina um, discrimina todos”). Eles faziam isso afrontosamente.”, conta Ernani Teixeira que para produzir o show realizou uma grande pesquisa sobre os movimentos de resistência e suas formas de expressão.
Sons de Liberdade apresentará versões instrumentais das principais canções do movimento Zazou e também interpretações em swing manouche dos mais famosos temas de resistência e protesto. Compõem o repertório grandes nomes da época como Charles Trenet, Johnny Hess, Alix Combelle e Georgius, mesclando-se com Chico Buarque, Caetano Veloso, Geraldo Vandré e João Bosco, passando pelos anos 80 com Legião Urbana e Titãs (e até mesmo uma homenagem dos Pet Shop Boys ao movimento Zazou), e chegando até o presente com Elza Soares, Caio Prado, Arnaldo Antunes, Pitty, Daniela Mercury, refrões de sambas-enredos e temas de hip-hop e mesmo de funk carioca que reverberam essa mesma mensagem de protesto contra a opressão e resistência criativa celebrando a vida.