Jornal de Campinas

O DERBY DOS MORTOS-VIVOS E DOS DESENCARNADOS

* Luiz Roberto Saviani Rey

Caros, Vendo agora na TV fechada documentário sobre o jornalista Mário Filho, sua vida e sua obra, as relações de paixão pelo esporte da pelota com o irmão, Nelson Rodrigues, outro excelso, e as relações de ambos com o futebol, a influência que tiveram na criação de um espírito festivo, alegre, belicoso, satírico e mordaz sobre o choque Flamengo x Fluminense – o FLA x FLU -, vejo e comparo o quanto Campinas deixou, e há muito, de ser a terra do futebol. Estamos há cinco dias do derby, o reencontro entre Ponte Preta e Guarani, e não há nada a abalar as estruturas desta torpe urbe mercantil que possa lembrar, de leve, que esse encontro irá ocorrer. A começar pelos escassos confrontos nas últimas décadas. Parece que dirigentes e torcedores têm medo. Fica evidente que, por uma certa conveniência incompreensível, é melhor esconder, tergiversar, descruzar os olhos e cruzar a calçada para não se ver. Nas redes sociais, não se pode brincar, desafiar com elegância, chamar a atenção para o jogo sem ser agredido, ameaçado, xingado! Futebol é emoção, alegria, antropologia, história e argumentação. Quanto mais boquirroto e irônico, mais se ilumina e colore a narrativa, e as almas todas se exaurem em um festival de confetes e serpentinas, balões coloridos e lanças-perfumes, parecendo como quando se escreve parabéns no Facebook: aquela explosão multicolorida e assaz alegre! Uma garrafa de soda limonada sendo aberta e borbulhando. Hoje, ainda mais com essa decisão burocrática e burra de se permitir apenas uma torcida nos estádios – seja o Brinco ou o Majestoso -, esvazia-se ainda mais o signo do derby, e o torna uma pelada comum de pernas-de-pau sem pátria, sem o viço das bandeiras agitadas, das torcidas engalanadas e festivas, torcendo e criando motes das arquibancadas. Lembrem-se que um clima assim, com narradores espirituosos e mordazes, como Mário Filho e Nelson Rodrigues, construiu-se não apenas o imaginário explosivo do futebol carioca, como erigiu-se um Maracanã, como o templo sagrado dessa consagração. Mas, pelo jeito, vamos ao derby como quem vai ao caixa eletrônico de um banco qualquer, retirar grana para comprar batatas na feira-livre! Boa tarde, pontepretanos e bugrinos sem alma e sem coragem para gritar e reagir!

Luiz Roberto Saviani Rey é jornalista, escritor e professor universitário

Read Previous

Cisto e atividade física

Read Next

A democracia de costas para o povo

Leave a Reply

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *