Clara Toledo Corrêa_Foto: Roncon & Graça Comun.
*Clara Toledo Corrêa
Muito antes do famoso “hit” do momento, ‘Bum Bum Tam Tam’ de MC Fioti –o “hino” da vacina CoronaVac do Instituto Butantan, inúmeros artistas lançaram músicas contendo as mais diversas marcas. Na maioria das vezes, marcas de grifes de roupas, bebidas, gomas de mascar (percebam que não utilizei a expressão ‘chicletes’, que na verdade se trata de uma marca registrada) e assim por diante.
Assim, percebemos que a gestão de uma marca vai muito além do mero registro. Por óbvio, o registro de uma marca é de extrema importância, pois sem ele não é possível mensurar o valor desse ativo de uma empresa, indústria ou instituição.
Entretanto, a gestão da marca, como já mencionado, vai muito além do registro perante o Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI – órgão responsável pelo registro de marcas, patentes e softwares no Brasil). Tal gestão deve tocar a experiência de seus consumidores, empregados, fornecedores, concorrentes e toda malha que sustenta e faz parte da cadeia de produção de um produto ou serviço.
Utilizar a indústria da música por citações espontâneas – como ocorreu no caso de MC Fioti – ou acordos comerciais pode ser considerada uma ótima estratégia para fixar a sua marca no mercado e chegar a um público muitas vezes inimaginável – o que pode ser algo positivo em termos de resultados financeiros entre outros ou pode não fazer a mínima diferença. Tudo depende do conhecimento de seu mercado e dos objetivos de seu negócio.
Por óbvio, no caso de MC Fioti e o Instituto Butantan tivemos muito mais que ganhos econômicos, mas sociais e de conscientização importante e em grande escala. O que é necessário para atravessarmos essa pandemia da Covid-19 e seu fim.
Entretanto, acredito ser possível afirmar que tanto o funkeiro quanto um instituto de pesquisa, nunca imaginaram o alcance e repercussão que tal “parceria” poderia causar para as marcas que tais figuras assinalam. O hit da vacina CoronaVac de MC Fioti já ultrapassou 1,5 bilhão de visualizações no YouTube.
Com certeza o Instituto Butantan nunca imaginou que consumidores de funk seriam seus consumidores diretos, bem como um MC até então não tinha adentrado ao Instituto de tal forma ou tivesse o “holofote” direto de governantes, o que se revelou uma troca riquíssima.
Não obstante, é interessante se atentar pelo fato de que o próprio Instituto Butantan (fundado em 23 de fevereiro de 1901), até pouquíssimo tempo não possuía o registro da marca ‘Butantan’. Apenas no final de 2019 é que o Instituto ingressou com o pedido de registro de sua marca (que já se encontra concedida) perante o INPI, abrangendo de produtos farmacêuticos para uso profilático a montagem de produtos de medicina humana.
Isso na verdade nada mais revela a cultura brasileira de não registros de marcas e outras formas de propriedade industrial e intelectual, infelizmente. Enquanto em outros países, instituições de pesquisas possuem suas marcas registradas.
Seria possível alegar que a falta de registro se daria por prioridades, mas ao se tratar de propriedade industrial, pesquisa, desenvolvimento e gestão e fomento destes, o que vemos é um provável sucateamento de setores e instituições tão importantes e uma mentalidade de não competição comercial perigosa.
Por esse e outros motivos que costumo afirmar – não se trata apenas do registro da marca (ou da patente), mas de todo o cenário complexo e profundo que se revela por de trás desse “simples” ato. Assim, o registro de uma marca é um pequeno passo para a gestão de um patrimônio inestimável.
*Clara Toledo Corrêa é especialista em Propriedade Intelectual e Industrial e advogada da Toledo Corrêa Marcas e Patentes. E-mail – clara@toledocorrea.com.br