Fabiano de Abreu desconstrói conceito psicológico com base na neurociência para a aceitação da morte por covid-19 dos seus entes queridos por não poder velar o corpo
Desde sempre escutamos que aceitar a morte de alguém obedece a um ciclo quase ritualizado em que a dor sentida tem que ser aglomerada à visão do corpo inerte, frio, sem vida. Esse momento duro e de choque seria especialmente necessário para a aceitação da finitude e daria lugar a um novo ciclo, uma nova estrada sem essa pessoa. Mas a época que vivemos fez com que tal não fosse possível. A pandemia da covid-19 afastou-nos dessa parte, afastou-nos da visualização do corpo morte, afastou-nos desse luto palpável. Poderíamos esperar portanto que o ciclo do luto não fosse completado. No entanto, para o neurocientista e psicanalista Fabiano de Abreu as coisas não tem que ser exatamente assim.
” Eu aceito essas estratégias comumente usadas para aceitar o término. No entanto, eu acredito muito mais no uso da inteligência emocional. Um luto em que a consciência e a razão estão presentes. Não ver o corpo não tem que significar a não aceitação da morte.”, esclarece.
Para Abreu, o não ver o corpo pode até acarretar aspectos positivos. ” A perda pode ser aceite quando a tornamos em algo consciente. Por outro lado, não ver quem gostamos morte acaba por ser positivo, pois vamos reter na memória as imagens e as vivências boas. É-nos possível fazer um engrama, uma pista neuronal dos momentos bons sem que o momento de choque possa criar um engrama maior de cunho negativo”, explica.
O neurocientista não descarta a importância dos passos naturais que são dados quando alguém falece, mas ressalva que o saber usar a nossa inteligência emocional pode ser tanto ou mais importante. ” O que realmente importa é que consigamos sentir que somos inteiros depois da partida de alguém. Alcançar um patamar em que ao recordar essa pessoa apenas as boas memórias prevalecem ajudará muito a encontrar o nosso bem-estar. A não presença dói mas recordar o que nos faz amar cura.”, conclui.