O avanço tecnológico e a grande oferta de possibilidades de ações e atividades nas redes sociais, principalmente em tempos de pandemia, vem demonstrando que o número de Nudes, compartilhamento de imagens (fotos) ou vídeos íntimos, cresceu em mais de 50% nos últimos 2 anos. Essa expressão de sexualidade na internet é permitida, desde que haja o consentimento do outro. Ou seja, é crime divulgar fotos ou vídeos íntimos de outra pessoa sem a permissão e autorização desta, além disso, essa exposição pode ser, extremamente, perigosa e trazer sérios danos emocionais para a vítima.
A prática de Nudes ou Sexting é perfeitamente normal, pois é uma forma de expressão onde o principal objetivo é a obtenção máxima do prazer através do movimento exibicionista ou do Voyeurismo saudável, motivado pelo desejo erótico. No entanto, quando essas imagens são divulgadas sem autorização ou quando existe a coerção remota de vítimas para que produzam conteúdo de cunho sexual, sob a ameaça de exposição online, fica configurada a infração ou crime, caracterizando assim o que chamamos de estrupo virtual ou Voyeurismo agressivo. Uma violência real que expõe o outro e que fere a intimidade alheia do indivíduo, seja homem ou mulher.
Pesquisas apontam que as mulheres e os jovens são as maiores vítimas deste tipo de agressão virtual. Mas a grande verdade é que nunca conhecemos totalmente o outro. Muitas das histórias de pessoas que tiveram fotos íntimas vazadas e divulgadas nas redes, demonstram que os responsáveis pelo vazamento, na maior parte das vezes, são pessoas com quem as vítimas estavam tendo algum tipo de relacionamento e que, no momento da troca de fotos ou vídeos, existia um elo de confiança e cumplicidade. Porém, não é possível garantir que quem recebe o nudes está agindo apenas com boas intenções. Não se pode afirmar que a solicitação do nudes está ligada apenas ao fato de que existe um prazer sexual a ser saciado. Fato é que, por diversas razões individuais, seja por: punição, maldade, perversidade ou até mesmo chantagem, o controle destas fotos e vídeos íntimos pode se perder e as imagens se tornarem púbicas, expondo totalmente a vítima.
Claro que não podemos fechar os olhos ou negar que, a internet e as redes sociais encurtaram distâncias e facilitaram a comunicação, principalmente, em meio ao isolamento social provocado pela pandemia. Mas, ainda assim, existem inúmeros perigos de se colocar em uma vitrine virtual. Os constrangimentos e as humilhações oriundas desse tipo de exposição sexual, facilitam transtornos, neuroses e podem causar danos físicos e emocionais sérios e preocupantes e que, sem dúvida, elevam sintomas de estresse pós-traumático e doenças psíquicas em um indivíduo.
E quais seriam as consequências desta exposição íntima? Infelizmente, o compartilhamento indevido de fotos ou vídeos pode levar a pessoa a um adoecimento mental tão severo, despertando sintomas característicos de ansiedade generalizada, depressão, alucinações, fobias intensas e até mesmo o suicídio. Inclusive, muitos jovens já atentaram contra a própria vida, por sofrerem essa violência e não serem capazes de conseguir lidar com os efeitos de uma exposição não consentida. Ou seja, impactos psicológicos que podem se tornar irreparáveis, caso não haja uma intervenção e acompanhamento de um profissional de saúde mental, além do acolhimento de uma rede de apoio preparada e estruturada para amparar as vítimas.
Alguns cuidados precisam ser observados por quem deseja se aventurar no mundo da troca Nudes: proteger-se através sites de segurança na internet e fora dela; não se deixar levar por pressões para produzir ou publicar imagens sensuais; não ceder aos apelos e chantagens do outro, por medo de perder a pessoa com quem se está relacionando; buscar entender que, se a pessoa quer seu bem, ela irá respeitar suas escolhas e decisões; amar-se e se colocar em primeiro lugar, seja em que relação for; ao se fotografar nu ou nua, busque não se identificar ou expor o rosto; desconfie dos excessos do outro, lembrando que todo excesso reflete uma falta; se estiver sendo chantageado, denuncie e converse com alguém de sua confiança; tome todos os cuidados e precauções possíveis para não se tornar mais uma vítima da internet.
O mais importante, no entanto, é não se culpar, caso tenha caído em uma armadilha virtual. A prática de enviar e tirar Nudes não é errada e não deve ser motivo de vergonha. O errado é transformar esse movimento que instiga o prazer em uma ação criminosa para expor a intimidade de uma pessoa. Isso configura desrespeito, agressão, violência psicológica e moral, além de um crime que precisa ter o agressor responsabilizado e punido.
O vazamento indevido e sem consentimento de um Nudes gera impacto negativo na estrutura emocional, provocando a sensação de constrangimento, vergonha e humilhação da vítima, uma vez que atinge a honra e arrasa a saúde mental e psíquica desta. O grande gatilho motivador do adoecimento psicológico é a desapropriação do corpo da pessoa que teve sua intimidade exposta, já que ela deixa de ter o controle de onde aquela imagem chegará. É um abuso psicológico de grande intensidade, pois na cabeça de quem sofre, seu corpo não mais lhe pertence, ele passa a ser escravo e objeto do desejo alheio. Uma sensação próxima de um abuso sexual, mesmo que não haja o contato físico. Um ato desumano que integra a cultura do estupro. Um verdadeiro trauma que interfere na construção da autonomia, da segurança, do amor próprio e da autoestima.
Enfim, todo cuidado é pouco ao se deixar expor nas redes. A blindagem e cautela é primordial para não cair em armadilhas. Lembrando que não podemos nos calar. É preciso denunciar e buscar ajuda de uma rede de apoio. Psicanaliticamente falando, a superação do trauma para quem sofreu essa violência psicológica, no entanto, passa por um processo terapêutico de reconstrução da dignidade e restauração da autoconfiança.
É muito importante trabalhar e resgatar a afetividade, no intuito de fortalecer a segurança nas relações interpessoais, uma vez que, a vítima pode vir a desenvolver mecanismos para se fechar para o mundo, com o intuito de se proteger, prejudicando futuros relacionamentos íntimos, por medo de sofrer novamente. No entanto, é possível ressignificar a dor, harmonizando e usufruindo de um equilíbrio interior mais adequado e preciso, através de um trabalho mental de autoconhecimento que contribua de forma a trazer leveza, segurança e estabilidade emocional para o indivíduo, apesar do Nudes sem consentimento, ferir a intimidade e expor o corpo e a alma da vítima. Neste sentido é muito importante recompor o “eu” presente para se sentir merecedor novamente de algo melhor.
Somente assim o “eu” futuro se consolidará como alguém mais forte, mais seguro e mais amável consigo mesmo, sem arrastar correntes de medos e traumas. Não se deixe contaminar por ameaças pessimistas, aprenda a investir em sua qualidade de vida, busque o prazer com resguardo e preservação e tenha um maior controle do fluxo de seus pensamentos, partindo do princípio de que bem-estar e felicidade ocorrem muito mais dentro do que fora de você. A grande sabedoria é ter um olhar mais atento, focado e livre de ingenuidades e carências que podem levar ao encontro de armadilhas virtuais ou reais.
Dra. Andréa Ladislau
Psicanalista