Por que será que algumas pessoas sentem fome o tempo inteiro? Um estudo publicado no começo de abril na Nature Metabolism desvendou porque algumas pessoas sentem fome e sempre e lutam para perder peso, mesmo em dietas com controle calórico. “A pesquisa diz que algumas pessoas experimentam uma queda brusca nos níveis de açúcar no sangue de duas a quatro horas depois de comer, o que estimula a fome. O trabalho destacou ainda a importância de compreender o metabolismo pessoal quando se trata de dieta e saúde”, explica a médica nutróloga Dra. Marcella Garcez, diretora e professora da Associação Brasileira de Nutrologia.
A equipe de pesquisa coletou dados detalhados sobre as respostas de açúcar no sangue e outros marcadores de saúde de 1.070 pessoas após comerem cafés da manhã padronizados e refeições escolhidas livremente por um período de duas semanas, somando mais de 8.000 cafés da manhã e 70.000 refeições no total. “Os cafés da manhã padrão eram baseados em muffins, contendo a mesma quantidade de calorias, mas variando na composição em termos de carboidratos, proteínas, gorduras e fibras. Os participantes também realizaram um teste de resposta ao açúcar no sangue em jejum (teste oral de tolerância à glicose), para medir o quão bem seu corpo processa o açúcar”, explica.
Os participantes usaram monitores contínuos de glicose (CGMs) para medir seus níveis de açúcar no sangue durante todo o estudo, bem como um dispositivo para monitorar a atividade e o sono. “Eles também registraram os níveis de fome e estado de alerta usando um aplicativo de celular, juntamente com exatamente quando e o que comeram durante o dia. Estudos anteriores que analisaram o açúcar no sangue depois de comer se concentraram na maneira como os níveis aumentam e diminuem nas primeiras duas horas após uma refeição, conhecido como pico de açúcar no sangue. No entanto, após analisar os dados, essa pesquisa notou que algumas pessoas experimentaram ‘quedas de açúcar’ significativas de 2 a 4 horas após esse pico inicial, onde seus níveis de açúcar no sangue caíram rapidamente abaixo da linha de base antes de voltarem a subir”, afirma a Dra. Marcella.
Essas pessoas tiveram um aumento de 9% na fome e esperaram cerca de meia hora a menos, em média, antes da refeição seguinte do que as pessoas que não experimentam essa queda brusca, embora comessem exatamente as mesmas refeições. “Os participantes que sofriam essa forte queda nos níveis de açúcar também ingeriram 75 calorias a mais nas 3 ou 4 horas após o café da manhã e cerca de 312 calorias a mais durante todo o dia do que os outros”, explica a médica. Esse tipo de padrão pode potencialmente se transformar em 20 libras de ganho de peso ao longo de um ano, o equivalente a 9 kg.
Há muito se suspeita que os níveis de açúcar no sangue desempenham um papel importante no controle da fome, mas os resultados de estudos anteriores foram inconclusivos. “Agora, a pesquisa mostrou que as quedas de açúcar são um indicador melhor da fome e da ingestão de calorias subsequente do que a resposta inicial do pico de açúcar no sangue após comer, mudando a forma como pensamos sobre a relação entre os níveis de açúcar no sangue e os alimentos que comemos”, explica a médica nutróloga.
Segundo a Dra. Marcella, muitas pessoas lutam para perder peso e mantê-lo, e apenas algumas centenas de calorias extras por dia podem chegar a vários quilos de ganho de peso ao longo de um ano. “A descoberta de que o nível da queda do açúcar depois de comer tem um grande impacto sobre a fome e o apetite tem um grande potencial para ajudar as pessoas a entender e controlar seu peso e saúde a longo prazo”, explica. O ideal, segundo a médica nutróloga, é reduzir o consumo de açúcares, buscando uma alimentação mais rica em nutrientes como fibras, gorduras saudáveis e proteínas.
A comparação do que acontece quando os participantes comem as mesmas refeições de teste revelou grandes variações nas respostas de açúcar no sangue entre as pessoas. Os pesquisadores também não encontraram nenhuma correlação entre idade, peso corporal ou IMC, embora os homens tenham quedas de açúcares um pouco maiores do que as mulheres, em média. “Escolher alimentos que funcionem em conjunto com sua biologia única pode ajudar as pessoas a se sentirem saciadas por mais tempo e a comer menos no geral”, explica a médica. Esse estudo abre caminho para orientação personalizada baseada em dados para aqueles que procuram controlar sua fome e ingestão de calorias de uma forma que funcione com o corpo, e não contra ele”, finaliza a Dra. Marcella.
FONTE
*DRA. MARCELLA GARCEZ: Médica Nutróloga, Mestre em Ciências da Saúde pela Escola de Medicina da PUCPR, Diretora da Associação Brasileira de Nutrologia e Docente do Curso Nacional de Nutrologia da ABRAN. A médica é Membro da Câmara Técnica de Nutrologia do CRMPR, Coordenadora da Liga Acadêmica de Nutrologia do Paraná e Pesquisadora em Suplementos Alimentares no Serviço de Nutrologia do Hospital do Servidor Público de São Paulo.